Omissão de falha em avião da Voepass pode ter causado tragédia

Foto: Paulo Pinto

Um ano após a queda do voo 2283 da Voepass, que matou 62 pessoas em Vinhedo (SP), uma revelação inédita lança nova luz sobre a tragédia. Um ex-funcionário da empresa afirmou ao g1 que um problema no sistema de degelo da aeronave foi relatado verbalmente horas antes da decolagem, mas não foi registrado no diário técnico obrigatório (TLB). Sem esse registro formal, a manutenção não foi realizada e o avião decolou mesmo com o risco identificado.

O sistema de degelo é essencial para voos em regiões com possibilidade de formação de gelo — como era o caso da rota para Cascavel (PR). Segundo o depoimento, o piloto que usou a aeronave antes do acidente alertou verbalmente sobre o mau funcionamento, mas a ausência de anotação no TLB fez com que a empresa liberasse o avião normalmente. O avião caiu em 9 de agosto de 2024 após três tentativas de ativar o sistema, que aparentemente falhou.

O depoente também denunciou uma cultura de pressão interna para evitar que aeronaves ficassem paradas. “Era a própria diretoria que exigia isso, queria o avião voando”, disse. A madrugada anterior à queda foi marcada por equipe reduzida e desorganização nos procedimentos de manutenção. O alerta verbal do comandante acabou ignorado pelo líder de turno.

As investigações da Polícia Federal, Cenipa e Anac apontam que o congelamento pode ter provocado perda de sustentação da aeronave. A caixa-preta registrou que o sistema de degelo foi acionado três vezes e que o copiloto mencionou a presença de “bastante gelo” dois minutos antes do impacto. Peritos do Instituto Nacional de Criminalística reforçam que a falha no sistema é considerada um fator determinante.

A Voepass não comentou diretamente a denúncia, mas disse, em nota, que sempre priorizou a segurança em seus mais de 30 anos de operação e que o acidente mobilizou a empresa no apoio às famílias e nas colaborações com as autoridades. Após o acidente, a Anac cassou o certificado de operação da companhia por falhas graves nos protocolos de segurança.

Entre os pontos destacados pelo ex-funcionário estão a rotina de manutenção postergada por meio de ações corretivas retardadas, a sobrecarga das equipes e a reincidência de problemas no ATR 72-500. A mesma aeronave já havia enfrentado episódios anteriores, como falhas no sistema de despressurização e um incidente com a cauda batendo na pista.

A Polícia Federal agora foca em identificar os responsáveis por possíveis negligências. “Já sabemos o que levou à queda. A pergunta é: quem contribuiu com esse resultado?”, disse o delegado-chefe da PF em Campinas. O caso continua em apuração e pode culminar em responsabilizações criminais por omissões que, segundo os especialistas, tornaram a tragédia evitável.