
O Supremo Tribunal Federal (STF) abriu, nesta terça-feira (2), o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e de outros sete réus apontados como integrantes do núcleo central da trama golpista de 2022. O processo envolve acusações de tentativa de golpe de Estado, organização criminosa armada e crimes contra o patrimônio da União.
Logo no início da sessão, o relator, ministro Alexandre de Moraes, fez um duro pronunciamento em defesa da independência da Corte. Sem citar nomes, afirmou que pressões internas e externas não irão intimidar o Supremo.
“Existindo provas, os réus serão condenados. Havendo dúvida razoável, serão absolvidos. Assim se faz Justiça”, declarou.
Moraes também fez referência a ataques coordenados do exterior contra ministros do tribunal, classificando-os como fruto de uma “organização criminosa covarde e traiçoeira”. Segundo ele, a soberania brasileira “jamais será negociada ou extorquida”. O ministro citou ainda a tentativa de ruptura democrática como um episódio que “só pode ser lamentado pela história do país”.
Na sequência, coube ao procurador-geral da República, Paulo Gonet, apresentar a acusação. Ele destacou que não é necessário um documento formal assinado para configurar tentativa de golpe de Estado. “A conspiração se revela nos atos, reuniões e planos voltados à ruptura constitucional, com uso ou ameaça de força bruta”, afirmou.
Gonet elencou os episódios que, segundo a PGR, comprovam a trama golpista: ataques às urnas, instrumentalização da PRF para restringir eleitores, reuniões para impedir a posse de Lula, uso irregular da Abin, acampamentos em frente a quartéis e, por fim, os atos violentos de 8 de janeiro de 2023. O procurador classificou os episódios como “atos espantosos e tenebrosos” e pediu a condenação de todo o núcleo central.
Segundo Gonet, Bolsonaro não apenas seria o principal beneficiado caso o golpe tivesse êxito, como também liderava a articulação criminosa.
“Não há como negar fatos praticados publicamente, planos apreendidos, diálogos documentados e bens públicos deteriorados”, disse o procurador.
As defesas, por sua vez, tentaram desmontar a acusação. O advogado do tenente-coronel Mauro Cid reforçou a validade da delação premiada do militar e negou que ele tenha incentivado qualquer atentado contra a democracia. Já a defesa de Alexandre Ramagem alegou que o ex-chefe da Abin não fazia mais parte do governo na época dos atos e negou que tenha usado a agência para monitorar autoridades.
O julgamento também foi marcado por uma intervenção firme da ministra Cármen Lúcia, que corrigiu o advogado de Ramagem ao confundir voto impresso com processo eleitoral auditável. “Uma coisa é a eleição auditável, outra é o voto impresso. Nosso sistema é amplamente auditável”, reforçou a magistrada.
Na defesa do almirante Garnier, o advogado Demóstenes Torres sustentou que não há ligação direta entre a conduta do militar e os fatos narrados pela acusação. Já o advogado de Anderson Torres, ex-ministro da Justiça, afirmou que sua viagem aos EUA antes dos atos de 8 de janeiro era de férias planejadas com antecedência. Sobre a minuta do golpe encontrada em sua casa, disse tratar-se de “documento apócrifo que já circulava na internet”.
Após as manifestações iniciais, o presidente da 1ª Turma, ministro Cristiano Zanin, suspendeu a sessão. O julgamento será retomado nesta quarta-feira (3), às 9h, com a continuidade das defesas, incluindo a do próprio Bolsonaro e de três generais acusados de integrar o plano golpista.