Choque tarifário entre potências acelera nova ordem mundial

Bandeiras da China e dos EUA (Crédito - Shutterstock)

A escalada da guerra de tarifas entre Estados Unidos e China, intensificada nesta semana, reacende debates sobre uma possível reconfiguração da ordem global. Enquanto Washington adota um discurso de proteção econômica e isolacionismo comercial, Pequim se posiciona como defensora do multilateralismo e da globalização econômica, reforçando parcerias estratégicas com países da África, América Latina e Europa.

As medidas protecionistas do presidente norte-americano Donald Trump, que retomou o poder em dezembro, incluem aumentos tarifários generalizados e decretos que dificultam o comércio internacional. Para especialistas em política externa, como Gustavo Uebel, da ESPM, trata-se de uma tentativa de impor a hegemonia americana sem recorrer à guerra convencional ou diplomacia tradicional.

Em resposta, o presidente chinês Xi Jinping tem articulado movimentos para fortalecer alianças e reforçar sua influência global. Em pronunciamento recente, Xi convocou os líderes mundiais a resistirem ao unilateralismo e manterem a tendência de integração econômica. A estratégia inclui diálogo direto com chefes de Estado e aproximações comerciais com blocos como a União Europeia e países da América do Sul.

O cenário indica a formação de um mundo tripolar, conforme apontado por Uebel: Estados Unidos, China e Rússia se consolidariam como as grandes zonas de influência global. Essa divisão tende a substituir a multipolaridade característica da geopolítica do pós-Guerra Fria, abrindo espaço para um sistema menos previsível e mais centrado em acordos bilaterais de força.

A União Europeia, pressionada pela dependência energética e militar dos EUA e em meio ao conflito na Ucrânia, começa a reavaliar suas alianças. Em reunião com o primeiro-ministro da Espanha, Pedro Sánchez, Xi Jinping propôs uma coalizão euro-asiática contra a política tarifária de Washington. A tendência é que Bruxelas se aproxime de Pequim por necessidade estratégica, e não por afinidade ideológica.

Na América Latina, tradicionalmente sob a esfera de influência americana, a China avança com iniciativas de cooperação econômica e institucional. O ministro do Comércio chinês manteve contato com o vice-presidente brasileiro Geraldo Alckmin para discutir o fortalecimento da Organização Mundial do Comércio (OMC), indicando interesse em redesenhar as regras do comércio global com apoio do Sul Global.

Críticos da política externa dos EUA, como a revista britânica The Economist, têm classificado a postura de Trump como autoritária e imprevisível. Em editorial, a publicação descreveu o novo modelo americano como uma “geopolítica mafiosa”, comparando-o ao estilo de Don Corleone, personagem central do filme O Poderoso Chefão, onde prevalecem acordos forçados e demonstrações de força.

A guerra de tarifas, portanto, vai além de uma disputa econômica. Ela simboliza um reposicionamento estratégico global, no qual o equilíbrio de poder deixa de ser definido apenas por instituições multilaterais e passa a depender cada vez mais da capacidade de influência direta das grandes potências sobre os blocos regionais.